18/09/2013

Nos tempos da Marshmallow

Por ocasião da edição de material visando a comemoração aos 60 anos do GAO, conversei com o Neimar Pacheco, DJ da boate mais famosa da região nos anos 80. Foram quase duas horas de conversa. Ele relembra o surgimento da Marshmallow, o sucesso atingido na cidade e na região num tempo muito diferente dos atuais. Os jovens saiam a pé pela cidade sem maiores temores. Violência era coisa de cidade grande. 

Os áureos tempos da Marshmallow

Por Solano Reis

Neimar Pacheco
O verbete  marshmallow é apresentado na Wikipedia como “um confeito que, em sua forma moderna, consiste de açúcar ou xarope de milho, clara de ovo batido, gelatina previamente amolecida em água, goma arábica e flavorizantes, batidos até tomarem uma consistência esponjosa”. 
Na década de 80 não havia Wikipedia.  Em Osório, no entanto, o verbete era por demais conhecido. Era sinônimo de festa, de juventude. Era sinônimo de GAO
Seu idealizador, Neimar Pacheco, guarda na memória todos os ingredientes que levaram à sua criação. “Não havia na cidade ponto de encontro para os jovens. Fazíamos reunião dançante na garagem da minha casa e juntava muita gente”, relembra, destacando que, quando seu pai Vilmar Pacheco assumiu a presidência do clube, sentiu que dali poderia surgir alternativa de entretenimento para aquele grupo de amigos. 
Em 1981, o grupo se reuniu na casa do presidente. Surgiu a ideia de ampliar aquelas reuniões dançantes num espaço maior. O GAO aparecia como o local ideal. Neimar lembra que tudo foi acontecendo ao acaso. “Tivemos que partir para a improvisação. Não havia som profissional, não havia DJ. Foi tudo sendo construído conforme a necessidade”.

O NOME 
A escolha do nome é um capítulo à parte. Durante a reunião de criação da boate surgiram diversas sugestões como Galalau e Open GAO . Um fato inusitado, no entanto, foi importante para a definição do nome. Conta Neimar que seu irmão Vilnei, que participava da reunião, foi até a geladeira e retirou de dentro uma embalagem. “Que nome estranho esse” teria dito, mostrando o creme de marshmallow. A sonoridade da palavra inglesa soou bem entre os jovens. Colocada a sugestão em votação foi aprovada por todos.
Já que  tudo nascia ao som do improviso, a escolha do DJ também não poderia ser diferente. Ocorre que todos os jovens queriam a liberdade de poder dançar e namorar. Como ninguém queria comprometer a noite toda animando os demais, coube ao autor da ideia a responsabilidade pela escolha do repertório e por tocar a noite toda. “Sem querer me tornei o DJ da festa”, lembra   Neimar.

PAINÉIS
Como o salão do GAO era muito amplo, surgiu a ideia de reduzir o ambiente para torná-lo mais aconchegante. O grupo optou por montar painéis coloridos reduzindo, assim, o espaço dando a impressão de que a casa estava sempre cheia.  Conforme Pacheco, a tarefa foi coletiva. Muitas mãos colaboraram na tarefa.
Naqueles tempos, quando o termo reciclagem ainda não estava em voga, a turma do GAO foi politicamente correta. Como a boate do GESB havia sido fechada, sobraram alguns painéis. A diretoria do clube coirmão os doou aos meninos do GAO que,por sua vez, os utilizaram na Marshmallow.  



ALTERNATIVO
O repertório da festa também cabe uma análise. Pacheco destaca que a preocupação era tocar aquilo que a gurizada gostava. E o rock estava em alta. Era o que os jovens preferiam. No entanto, se faziam concessões. Neil Young, Bob Dylan, David Bowie, Rolling Stones e Led Zeppelin. 
Marcelo Rech foi um dedicado auxiliar de Neimar. Ajudava na montagem de som e de luzes. De quebra, vez por outra, especialmente quando havia algum impedimento do DJ titular, ele assumia o comando do som. A preferência era pelo rock. “Aproveitamos aquele período excelente do rock nacional com Paralamas, Engenheiros, Kid Abelha, Barão Vermelho e tantos outros”. Lembra que não tocavam só os singles. “Tocávamos muito o lado B dos discos e isso agrava muito”.


Um fenômeno regional


Os resultados dos primeiros tempos da Marshmallow foram satisfatórios. O clima de amizade e respeito conquistou a cidade. Neimar Pacheco acredita que contribuiu para isso a presença de casais mais velhos para impor limites bem definidos à garotada. “Meu pai trabalhava a noite toda. Ficava na beira da pista evitando que a gurizada dançasse com copos na mão para evitar acidentes”, recorda. 
A esposa do presidente, Frânei Pacheco, por sua vez, também permanecia no recinto. Tinha como função evitar os excessos dos casais mais afoitos. 
Com o tempo, a boate do GAO foi tomando corpo. Ganhou uma dimensão maior. Já não era mais a festa da turma do Neimar. Os jovens da cidade se apropriaram da Marshmallow. A fama foi se espalhando. Cresceu a presença dos jovens de municípios próximos. Depois disso, a festa se abriu definitivamente. Na vinda para a praia, vários meninos de Porto Alegre e de Novo Hamburgo se programavam para passar por Osório e curtir a Marshmallow.
Ainda hoje, passadas três décadas, Neimar Pacheco é surpreendido por pessoas que dizem ter passado pela pista do GAO. “Já fui abordado por pessoas que não conheço em Torres, em Porto Alegre, que me perguntam: tu não és o cara de Osório, lá da Marshmallow?”. Surpreso com as abordagens, Neimar não esconde que muitas vezes se emociona quando lembra que a iniciativa daqueles jovens rendeu frutos não só para os amigos de Osório, mas sim para uma parcela significativa da juventude regional. 
 

Das pistas para a avenida 

A influência da Marshmallow não se restringiu à presença dos jovens na boate. Conta Neimar Pacheco que, incentivados pela convivência frequente, os jovens iniciaram uma série de ações que fortaleceram o GAO em vários aspectos. Um deles foi a formação de um bloco carnavalesco, que depois se transformou em escola de samba. “Acho que isso serviu de incentivo para que o Patrocínio entrasse na avenida, tornando o Carnaval de Osório um modelo para a região”.
“Aliás, a relação entre as duas agremiações foi sempre muito positiva.” Houve um ano em que o Patrocínio encontrava dificuldades.  O GAO destinou a renda de uma boate para auxiliá-los”.

Do salão para o futebol

A convivência com tantos jovens, com tanta regularidade, foi fundamental para que o esporte voltasse a fazer parte da proposta do clube. Depois de 20 anos afastado dos campos, o GAO motivado pela sua juventude retoma sua participação no Campeonato Municipal. O ano era 1982. O time voltou a ser campeão. A renda da Marshmallow auxiliava no financiamento das despesas.

Matéria sobre a boate no Jornal Novo Tempo - 1983


Um comentário:

  1. E então, quando termos novamente uma Marshmalllow no GAO? Creio que, no momento em que o clube completa seus 60 anos, seria uma data significativa para relembrar os bons tempos!!

    Jerri Almeida

    ResponderExcluir